quarta-feira, 28 de dezembro de 2016

sem precedentes
o amor,
invade e rasga
com seus vorazes dentes
os corpos
(invisíveis asas)
calças, botões, saias
para atravessar
até o mais fundo da epiderme
tocando uma pele
à outra
pelo poder do enlaço
de almas desconhecidas
que se reconhecem
somente
quando estão nuas
por isso que amar
é, também,
despir-se

quinta-feira, 1 de dezembro de 2016



meu coração palpita
um tanto
fora de forma
do ritmo de outrora
torto
um coração palpita
ali, bem ao lado
solto
entretanto
ele é meu
bate nas ruas, na calçada
sem dono
pulsa nos andarilhos,
nas guerrilhas
nos conflitos
no peito que doído
do outro.



quarta-feira, 16 de novembro de 2016

saudade, saudade
meu pleonasmo
vicioso e constante
de canceriana
descoberta por suas conchas
perdidas na areia
sem os mares
lares
sou muito do ontem
saudade, saudade
tento te fazer mais nova
ou criança
mas és velha e sábia
e me carregas
no colo
quando desabo,
por isso és  também como uma companheira
saudade, saudade
gostaria, minha amiga
que fosses lembrança
mas tu
em minha vida é pleonasmo
porque se repete
no presente.

segunda-feira, 17 de outubro de 2016



ontem choveu
via as janelas abertas
fora
tudo molhava
e dentro
enxurrada forte no peito
que já virou cascata
penso nas coisas que água leva
borrando o corpo
o contorno da letra
que também é água
aqui, no espaço largo do verbo
sou toda
cachoeira.

segunda-feira, 3 de outubro de 2016




inquieta
a noite pousa nas letras
e em minha boca
beijo-as
em palavras
quando escrevo
para rascunhar delírios noturnos secretos
já tão expostos em versos
de uma poesia inacabada
sempre
...


porque tudo se esvai
só a poesia
persiste.


segunda-feira, 26 de setembro de 2016


da janela de fora
estrondo
da janela de dentro
silêncio
muda e envelhecida
minha sinfonia dos dias se faz, música.


quando meu calendário de outrora
esse outro
que ignoro para ser somente
aquilo que sinto
e não devo
ao relógio

orbito em direção
contra
para além de qualquer tempo
sou apenas isso
o agora
crua

aqui,
diante de seus olhos.


sexta-feira, 1 de julho de 2016



amanheço todos os dias
com a folha do papel
virgem
em seu branco seminal
pedindo nas linhas
num eterno
ritornelo
do avesso
para sempre,
mesmo com os pontos e vírgulas,
continuar.


quarta-feira, 22 de junho de 2016

bebo litros de café
em meio às letras escritas e borradas
confundo o gosto do texto com as bordas de minha xícara 
amacio com os dedos os borrões turvos de um amarelo amanhecido, 
como o dia cinza 
que nebulosamente se abre em chuva
por trás de minha janela de cortinas fechadas e abertas para poesias
bebo litros de café
enquanto sinto as mãos suaves do inverno sobre minha boca
esmaecida.



...








segunda-feira, 20 de junho de 2016


...

quando em mim tudo é ausência
e me alimento da memória
de passagens impregnadas na pele
histórias
que levo no corpo.
assisto tudo com calma,
contemplação
agradecendo ao tempo
e seu misterioso rastro
milagroso, irreversível
dou-lhe todas as minhas marcas
em forma de prece
jorrando a poesia silenciosa
do cheiro, que revela
na falta
quando em mim tudo é presença.



...



terça-feira, 14 de junho de 2016

pelo menos
por enquanto
até as minhas mãos aguentarem mais a escrita
até a escrita não aguentar mais as minhas mãos
e os meus pés a dança
e a dança os meus pés, e meu corpo movimento
gritar com o mundo e dizer
estou aqui, mesmo que não me veja
esse é o meu cheiro
de carne
e terra.
serei inteira
toda
enquanto, tudo torna-se poeira
sujos escombros do mundo
rasgo as minhas correntes
internas, presa ao fundo
para ser toda
ao menos, por enquanto
quando
escrevo e danço
sou
eu, e elas
todas
porque amo
e amar é revolucionário
porque danço
e escrevo
como estratégia de sobrevivência
mesmo quando me tapam as mãos, a boca,
não prenderão jamais,  meus pés, que já estão
quando escrevo
pois voo
sou estrangeira
ao menos por enquanto,
enquanto
sou essa
e tantas
quando escrevo
com todo o meu corpo
rasgo o involucro da lagarta
mordo
nasço
a cada instante, pelas letras que aqui deixo
porque escrever
é resistência.













segunda-feira, 9 de maio de 2016

(in)confissões,

mergulho novamente
aos caos,
como se precisasse sempre, a cada renovação, partir ao encontro da desordem
novamente,
o ritornelo que agora só é eco,
o canto já foi
apenas ecoa,
a garganta inflamada dificulta a passagem do ar e o desejo de pegar nos livros,
tomo café,
recolho os pedaços de memória que me fazem,
aquilo tudo que chamo de sou.
quebro-me constantemente para ser
voltar
ser de novo, ou nova.
reconstruo o espelho pelas beiradas até chegar ao centro de minha face
eu: estranha miragem
perdida no espaço tempo
boca entreaberta
com gosto de café
lembro das pessoas que amei, e penso se ainda permanecem, em algum lugar do corpo
para onde foram, todas, todos?
entro em mim própria
ainda mais dentro
isso é possível?
corro
dentro até o meio,
se pudesse me desenhar começaria pelos pés,
corro
para ainda mais dentro, navego em minhas mais pequenas memórias: vou até os sonhos de criança. De repente estou ali, deitada na grama, passo minha pele de fininho no verde e espeto,
poro por poro.
vejo as formigas caminhado, faço uma barragem com uma pedrinha
lembro de minha vó,
Mirela desce daí, você vai quebrar a perna desse jeito
do ovo de gema mole,  do sorriso. do cafuné
do amor que não passa.
sabe vó, às vezes eu ainda sou aquela menina
que nadava cachorrinho no ribeirão,
eu sinto falta dela, também.
corro
lembro do meu primeiro amor, de escola
quando os nossos braços quase encostavam
no recreio
volto a quebrar os pedaços para me encontrar depois
bêbada
anos mais tarde. falando comigo mesma
diante do espelho
corro
mais fundo, e já me vejo escrevendo.
desde ontem
ou sempre
aqui estou, no centro do furacão
escrevendo,
corro
mais profundo
estou dançando no escuro, sozinha
a solidão que me faz reconhecer
para outra
que também sou
sai pela memória em outro lugar
corro
mais rápido que posso
seria o retorno de saturno?
o que me atravessa brutalmente em memórias
devaneios
não posso confundir o real do sonho
corro
e vejo agora as paredes todas brancas,
seria minha alma?
são como almofadas
passo-me
como se pudesse pintar com minha pele toda a sua branquidão
a minha cor
que já passou por tantos lugares
tanta gente
escrevo
pinto, e escrevo,
deixo o meu rascunho lá
o espelho se recompõe em outras formas
lembro de Ouro Preto,
segundo lugar de nascimento
dos meus mais belos anos,
sou o que escolhi,
ser?
pergunto pra menina que nadava cachorrinho
que me olha com olhos gigantes
engraçado é lembrar de como a gente se imaginava
adulto.
não me arrependo,
respondo para ela,
sorrimos,
ela segura a caneta
e me lembra:
quando perco os pés, e as referências todas
acá estou
entre o verbo e o peito,
e as as reticências
das letras
todas abertas,
sendo
o que sou.




segunda-feira, 2 de maio de 2016

em tempos tão estranhos,
ter-te, mais, sempre
e novamente
é acreditar
no sonho
quando
em ti
sou
tu -
a;






...










sexta-feira, 15 de abril de 2016

essa saudade que tem cheiro
gosto e nome
............................................





passeia na minha língua.

.........................................


                                       essa vontade.........................................................................................













transcrevo  nosso suor num papel
para que outros leiam
aquilo que só nós
quando a sós
falamos em
poema.



estudos sobre o vento e a cor




procuro muito de minha face
onde já não me reconheço
no verde e no azul
do tempo
nu
.




junto minha pele à paisagem. 



quarta-feira, 13 de abril de 2016

hoje
com cheiro de terra e raiz
arranhando minhas pernas,
caminho
lembrando do tempo
em que fui árvore.









em tempos assim, de doença generalizada
só o afeto cura. 

sexta-feira, 8 de abril de 2016



























A cada dia mais velha
com linhas e marcas,
mais menina.
Reaprendendo a ser mais leve, até virar pipa e voar.
Ir embora 
e viver
sem endereços.
Não patriarcado, você não me rastreia.
Não mais, to indo embora.
Virando criança de novo até voltar pra barriga.
E nascer de novo, sempre.
A cada dia. 









quinta-feira, 7 de abril de 2016






olha-me bem
agora
pois perco o meu nome 
a cada encontro
e volto 
em tempo de espera
olha-me bem 
por ora
pois amanhã serei outra
distante e serena
perto 
das páginas apenas
que em nosso colo
se fazem poema
olha-me bem
hoje
e sem pressa
pois amanhã estarei com as letras
porque perco o meu nome
para ser poeta.
olha-me bem
e aqui esteja
para poder reconhecer-me em ti
quanto tiver perdido em seus braços
o meu nome.



quarta-feira, 9 de março de 2016


o verso se faz
em seu sábio tecido
de linhas invisíveis
soltas
pelas palavras que costuro
o verso se faz
estendido entre minha língua
e o sonho
das noites em que passo sozinha
inquieta
o verso se faz
para que eu possa sê-lo
no corpo,
ser também por ele
escrita,
nas letras que me acompanham
sempre
em vigília
o verso se faz
presente
quando tudo é ausência.




domingo, 31 de janeiro de 2016

quando um corpo vai
e outro corpo fica
há sempre um limite entre o desejo
de ficar
ou de partir
há sempre um entremeio
um laço invisível entre os corpos
e suas distâncias.





quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

uma boa mulher aprende desde cedo a sentar com as pernas fechadas
uma boa mulher escuta primeiro a palavra mulher
para depois escutar a palavra menina
uma boa mulher se prepara
sempre para os outros
para ser bonita
limpa


uma boa mulher aprende desde cedo a se portar como uma boa mulher
aprende que precisa ser feminina e ter a boca bem limpa
não falar nome feio e não se misturar com meninos
uma boa mulher gosta de ouvir que é bonita
tira boas notas e é elogiada
pela professora
pela família


uma boa mulher tem o boletim bonito mas ganha menos que os meninos
mesmo trabalhando melhor e mais, como as outras meninas
uma boa mulher precisa casar para ser reconhecida
para ser vista como uma mulher feliz e boa
para seu marido, filhos, filhas
mas sorte é que antes de ser
boa, as mulheres são
sozinhas
e
andam por aí escolhendo,
as más companhias:
aquelas que
dizem
não:


não somos boas meninas.






segunda-feira, 18 de janeiro de 2016

Tem gosto de sal
Em toda minha escrita
Espessa
Nāo sei mais o que é ontem
Porque o hoje consome todo meus desejos
Num lento calendário
Que é mar
E o tempo
Se faz no poema
Onde me encontro no espaço
Solitária escrevo
Voo com as gaivotas
Até o horizonte
E retorno
para as letras
Como ondas
Em movimento
Danço com as águas
E Escrevo
Para viver
Mais uma
toda a paisagem
Que guardo no corpo.


Venha
Quando não quiser mais nada
E eu
Farta de minha existência
Repousarei em ti
Meu corpo também cansado
Em teu dorso
Deitada
Sentirei no rosto
Nas têmporas vermelhas
O suor de nosso encontro
Traçado so acaso
Serei tua
Em todas as noites de sua peregrinaçāo
Serena
Pois pelo dia
Parto
Como um sonho
E suas māos
Nas minhas
Viram memória
Venha
Meu eremita
Antes que o presente escape
Quando o dia acabe
Venha
Antes que eu me esqueça.

terça-feira, 12 de janeiro de 2016

domingo, 10 de janeiro de 2016

não quero o retorno
ainda me falta muito
desde as palavras que não consigo escrever
até os caminhos traçados pelo sol
que não percorri
não quero o retorno
ando entre as pedras
para o entendimento de meu corpo
já tão distante do resto
e presente
no essencial
não quero o retorno
meus sonhos
têm cheiro de terra
e os pego com os dedos
firmes
como se fossem teus
grande eremita das matas
aquele que banha meu corpo
com suas mãos selvagens
doces
não quero o retorno
pois estou no alto da montanha
ensolarada
à espera da noite,
para dormir
em suas estrelas
não quero o retorno
porque ainda navego
para perto de ti
meu eremita










sábado, 9 de janeiro de 2016


quente
entre a pedra verde
virando céu e água
foi ali
que perdi meu nome
para ser o instante
e mais nada.

entre as pedras
do rio
no ar
recolho as belezas que me foram doadas
quado já não esperava mais nada
e encontrei
o encanto mais singelo
misturado à terra
e aos meus pés nus
quando se tocam
em dias de chuva
em tua relva
bebo
a água
que me torno
doce e serena
falta-me, às vezes, tanto
mas em ti, fortaleza
sou repleta

terça-feira, 5 de janeiro de 2016

Há algo que vai
Enquanto tudo permanence
As rochas
Verdes, cinzas de beleza
Estão
Quando tudo já foi:
O vento. A chuva
Meus amores
Soltos
Esvaídos pelo tempo
Não são rochas
Nem mesmo fagulhas de momento
Em fogo
São águas
Sempre correm
Uns retornam
Alguns partem
Outros
Viram poemas
Escritos
Insólitos.
Há algo que vai
Enquanto tudo permanence.
Meus ossos
E sonhos.